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Fórum 2022 – Na força do Espírito – emissão online de sábado

Programa completo em https://www.comunidade-emanuel.pt/forum/

Este ano, este evento anual proposto pela Comunidade Emanuel será em Coimbra, no Salão Paroquial da igreja de São José. Claro que poderá acompanhar todas as atividades online, aqui, a partir do YouTube – no entanto, teríamos imenso gosto que pudesse estar presencialmente conosco, no Salão de São José, em Coimbra.

O tema – “Na força do Espírito” – será desenvolvido por um irmão belga da comunidade, o Jean-Luc Moens, que até há poucos meses era também o Moderador Internacional da Charis. Contaremos ainda com a presença do bispo de Coimbra, D. Virgílio, que nos virá dar uma perspetiva de “Como é que o Espírito Santo conduziu a Igreja desde o Concílio Vaticano II”, e da Ir. Goreti, uma doroteia, que nos dará pistas concretas de como “Viver do Espírito Santo no quotidiano”.

Transmissão no sábado: https://youtu.be/x6lD3wo9rn0
Transmissão de Domingo: https://youtu.be/cEOPnZNx41M

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A LITURGIA DA PALAVRA – 1ª Pregação da Quaresma 2022

Nesta sexta-feira, 11 de março, o pregador da Casa Pontifícia, cardeal Raniero Cantalamessa, OFMCap, propôs à Cúria Romana a primeira pregação da Quaresma: “A Liturgia da Palavra”.

https://www.vaticannews.va/pt/vaticano/news/2022-03/i-pregacao-quaresma-2022-cardeal-raniero-cantalamessa.html

Entre os vários males que a pandemia da Covid tem causando à humanidade, houve ao menos um efeito positivo do ponto de vista da fé. Ela nos fez tomar consciência da necessidade que temos da Eucaristia e do vazio que cria a sua falta. Durante o período mais agudo da pandemia em 2020, fiquei fortemente impressionado – e comigo, penso que muitos outros – com o que significava assistir pela televisão toda manhã à Santa Missa celebrada pelo Papa Francisco em Santa Marta.

Algumas igrejas locais e nacionais decidiram dedicar o ano corrente a uma catequese especial sobre a Eucaristia, em vista de um desejado renascimento eucarístico na Igreja católica. Parece-me uma decisão oportuna e um exemplo a ser seguido. Por isso, pensei em dar uma pequena colaboração ao projeto, dedicando as reflexões desta Quaresma a uma revisitação do mistério eucarístico.

A Eucaristia está no centro de todo tempo litúrgico, da Quaresma, não menos que nos demais tempos. É o que celebramos cada dia, a Páscoa diária. Cada pequeno progresso na sua compreensão se traduz em um progresso na via espiritual da pessoa e da comunidade eclesial. Contudo, ela é também, infelizmente, a coisa mais exposta, pela sua repetitividade, a cair na rotina, a se tornar coisa habitual. São João Paulo II, na Carta Ecclesia de Eucharistia de abril de 2003, diz que os cristãos devem redescobrir e manter sempre vivo “o estupor eucarístico”. Assim, a este fim, gostariam de servir as nossas reflexões: a reencontrar o estupor eucarístico.

Falar da Eucaristia em tempo de pandemia e agora, por acréscimo, com cenas de guerra diante dos olhos, não é um alienarmo-nos da realidade dramática em que vivemos, mas um convite a olhá-la de um ponto de vista superior e menos contingente. A Eucaristia é a presença na história do evento que inverteu para sempre os papéis entre vencedores e vítimas. Na cruz, Cristo fez da vítima o verdadeiro vencedor: “Victor quia victima”, assim define Santo Agostinho: vencedor justamente porque vítima. A Eucaristia nos oferece a verdadeira chave de leitura da história. Nos assegura que Jesus está conosco, não apenas intencionalmente, mas realmente neste nosso mundo que parece escapar de nossas mãos a qualquer momento. Ele nos repete: “Tenha coragem: eu venci o mundo!” (Jo 16:33).

A Eucaristia na história da salvação

Que posto ocupa a Eucaristia na história da salvação? A resposta é: não ocupa um lugar, mas a ocupa inteiramente! A Eucaristia é coextensiva à história da salvação. Ela, porém, está presente em três modos diversos, nos três diversos tempos, ou fases, da salvação: está presente no Antigo Testamento como figura; está presente no Novo Testamento como evento e está presente no tempo da Igreja como sacramento. A figura antecipa e prepara o evento, o sacramento “prolonga” e atualiza o evento.

No Antigo Testamento, dizia eu, a Eucaristia está presente “em figura”. Uma destas figuras era o maná, uma outra era o sacrifício de Melquisedec, uma outra ainda era o sacrifício de Isaac. Na sequência Lauda Sion Salvatorem, composta por Santo Tomás de Aquino para a festa de Corpus Christi, canta-se: “As figuras o simbolizam: é Isaac que se imola, o cordeiro que se destina à Páscoa, o maná dado a nossos pais”: In figúris præsignátur, / cum Isaac immolátur: /agnus paschæ deputátur: /datur manna pátribus.  Enquanto figuras da Eucaristia, Santo Tomás chama estes ritos de “os sacramentos da antiga Lei”[1].

Com a vinda de Cristo e o seu mistério de morte e ressurreição, a Eucaristia não está mais presente como figura, mas como evento, como realidade. Nós o chamamos “evento” porque é algo historicamente acontecido, um fato único no tempo e no espaço, ocorrido apenas uma vez (semel) e irrepetível: Cristo, “na plenitude dos tempos, uma vez por todas, se manifestou para destruir o pecado pelo sacrifício de si mesmo” (Hb 9,26).

Enfim, no tempo da Igreja, a Eucaristia, eu dizia, está presente como sacramento, isto é, no sinal do pão e do vinho, instituído por Cristo. É importante que compreendamos bem a diferença entre o evento e o sacramento: na prática, a diferença entre a história e a liturgia. Deixemo-nos ajudar por Santo Agostinho.

Nós – afirma o santo doutor – sabemos e cremos com fé certíssima que Cristo morreu uma só vez por nós, ele, justo pelos pecadores, ele, Senhor pelos servos. Sabemos perfeitamente que isso aconteceu uma só vez; e, contudo, o sacramento periodicamente o renova, como se se repetisse várias vezes o que a história proclama ter acontecido uma só vez. E, ainda assim, evento e sacramento não contrastam entre si, quase como se o sacramento fosse enganoso e apenas o evento fosse real. De fato, do que a história afirma ter acontecido na realidade, uma só vez, o sacramento renova (renovat) frequentemente a celebração disso no coração dos fiéis. A história desvela o que aconteceu uma vez e como aconteceu, a liturgia faz com que o passado não seja esquecido; não no sentido de que o faz acontecer de novo (non faciendo), mas no sentido de que o celebra (sed celebrando)[2].

Precisar o nexo que existe entre o sacrifício único da cruz e a Missa é algo bem delicado e tem sido sempre um dos pontos de maior discordância entre católicos e protestantes. Agostinho usa, como vimos, dois verbos: renovar celebrar, que são justíssimos, com a condição, porém, de serem compreendidos um à luz do outro: a Missa renova o evento da cruz celebrando-o (não reiterando-o!) e o celebra renovando-o (não apenas recordando-o!). A palavra, na qual se realiza hoje o maior consentimento ecumênico, é talvez o verbo (usado também por Paulo VI, na Encíclica Mysterium fideirepresentar, compreendido no sentido forte de re-apresentar, isto é, tornar novamente presente[3]. Neste sentido, dizemos que a Eucaristia “representa” a cruz.

Segundo a história, houve, portanto, uma só Eucaristia, aquela realizada por Jesus com a sua vida e a sua morte; segundo a liturgia, ao contrário, ou seja, graças ao sacramento, há tantas Eucaristias quantas são celebradas e serão celebradas até o fim do mundo. O evento se realizou uma só vez (semel), o sacramento se realiza “cada vez” (quotiescumque). Graças aos sacramento da Eucaristia, nós nos tornamos, misteriosamente, contemporâneos do evento; o evento se faz presente a nós e nós ao evento.

As nossas reflexões quaresmais terão por objeto a Eucaristia em seu estágio presente, isto é, como sacramento. Na Igreja antiga existia uma catequese especial, chamada mistagógica, que era reservada ao bispo e era ministrada depois, não antes, do batismo. O seu objetivo era revelar aos neófitos o significado dos ritos celebrados e as profundezas dos mistérios da fé: batismo, crisma ou unção, e, particularmente, a Eucaristia. O que nos propomos fazer é justamente uma pequena catequese mistagógica sobre a Eucaristia. Para permanecer o mais ancorados possível na natureza sacramental e ritual dela, seguiremos de perto o desenvolvimento da Missa em suas três partes – liturgia da palavra, liturgia eucarística e comunhão –, acrescentando no fim uma reflexão sobre o culto eucarístico fora da Missa.

Liturgia da palavra

Nos primeiríssimos dias da Igreja, a liturgia da Palavra era separada da liturgia eucarística. Os discípulos, referem os Atos dos Apóstolos, “dia após dia, unânimes, frequentavam o templo”; aí escutavam a leitura da Bíblia, recitavam os salmos e as orações, junto com os outros judeus; faziam o que se faz na liturgia da Palavra; depois se reuniam à parte, em suas casas, para “partir o pão”, isto é, para celebrar a Eucaristia (cf. At 2,46).

Bem cedo, contudo, esta praxe se tornou impossível, seja pela hostilidade da parte das autoridades hebraicas em relação a eles, seja porque as Escrituras tinham então adquirido para eles um sentido novo, orientado todo a Cristo. foi assim que também a escuta da Escritura se transferiu do templo e da sinagoga aos lugares de culto cristãos, assumindo pouco a pouco a fisionomia da atual liturgia da Palavra que precede a oração eucarística. Na descrição da celebração eucarística feita por São Justino no II século, não apenas a liturgia da Palavra é parte integrante dela, mas às leituras do Antigo Testamento se juntaram aquelas que o santo chama “as memórias dos apóstolos”, isto é, os Evangelhos e as Cartas, na prática o Novo Testamento[4].

Escutadas na liturgia, as leituras bíblicas assumem um sentido novo e mais forte do que quando lidas em outros contextos. Não têm tanto a finalidade de conhecer melhor a Bíblia, como quando é lida em casa ou em uma escola bíblica, quanto a de reconhecer aquele que se faz presente no partir o pão, de iluminar a cada vez um aspecto particular do mistério que está por se receber. Isto aparece, de modo quase programático, no episódio dos dois discípulos de Emaús. Foi escutando a explicação das Escrituras que o coração dos discípulos começou a se abrir, de modo que foram depois capazes de reconhece-lo “ao partir o pão” (Lc 24,1ss.). A de Jesus ressuscitado foi a primeira “liturgia da palavra” na história da Igreja!

Segunda característica: na Missa, as palavras e os episódios da Bíblia não são apenas narrados, mas revividos; a memória se torna realidade e presença. O que acontece “naquele tempo”, acontece “neste tempo”, “hoje” (hodie), como ama expressar-se a liturgia. Nós não somos apenas ouvintes da palavra, mas interlocutores e atores nela. É a nós, ali presentes, que é dirigida a palavra; somos chamados a assumir o lugar dos personagens evocados.

Alguns exemplos ajudarão a entender. Uma vez se lê, na primeira leitura, o episódio de Deus que fala a Moisés da sarça ardente: nós estamos, na Missa, diante da verdadeira sarça ardente… Uma outra vez, fala-se de Isaías que recebe nos lábios a brasa ardente que o purifica para a missão: nós estamos prestes a receber nos lábios a verdadeira brasa ardente, o fogo que Jesus veio trazer sobre a terra… Ezequiel é enviado para comer o rolo dos oráculos proféticos: nós nos aproximamos para comer aquele que é a própria palavra feita carne e feita pão.

A coisa se torna ainda mais clara se, do Antigo Testamento, passamos ao Novo, da primeira leitura ao trecho evangélico. A mulher que sofria de hemorragia está certa de ser curada se conseguir tocar a barra do manto de Jesus: o que dizer de nós, que estamos prestes a tocar bem mais do que a barra do seu manto? Uma vez, escutava no Evangelho o episódio de Zaqueu e fui tocado pela “atualidade”. Eu era Zaqueu; eram dirigidas a mim as palavras: “Hoje eu devo ficar na tua casa”; era de mim que se podia dizer: “Ele foi hospedar-se na casa de um pecador!”, e era a mim, após tê-lo recebido na comunhão, que Jesus dizia: “Hoje a salvação entrou nesta casa” (cf. Lc 19,9).

Assim também de cada episódio evangélico. Como não se identificar na Missa com o paralítico ao qual Jesus diz: “Os teus pecados estão perdoados” e “Levanta-te e anda” (cf. Mc 2,5.11); com Simeão, que segura nos braços o Menino Jesus (cf. Lc 2, 27-28); com Tomé, que toca as suas feridas (Jo 20,27-28)? No segundo domingo do Tempo Comum do corrente ciclo litúrgico, há o trecho evangélico em que Jesus diz ao homem da mão paralisada: “‘Estende a mão’. Ele a estendeu e a mão ficou curada” (Mc 3,5). Nós não temos a mão paralisada; porém, temos todos, quem mais e quem menos, a alma paralisada, o coração ressecado. É a quem escuta que Jesus diz naquele momento: “Estende a tua mão! Estende o teu coração diante de mi, com a fé e a prontidão daquele homem”.

A Escritura proclamada durante a liturgia produz efeitos que estão acima de toda explicação humana, à maneira dos sacramentos que produzem o que significam. Os textos divinamente inspirados também têm um poder de cura. Após a leitura do trecho evangélico na Missa, a liturgia convida o ministro a beijar o livro dizendo: “Pelas palavras do santo Evangelho sejam perdoados os nossos pecados” (Per evangelica dicta deleantur nostra delicta).

Ao longo da história da Igreja, eventos de época aconteceram como resultado da escuta das leituras bíblicas durante a Missa. Um jovem ouviu um dia o trecho evangélico em que Jesus diz a um jovem rico: “Se queres ser perfeito, vai, vende os teus bens, dá aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois vem, e segue-me” (cf. Mt 19,21). Entendeu que aquela palavra era dirigida a ele pessoalmente, por isso, foi para casa, vendeu tudo o que tinha e se retirou no deserto. Seu nome era Antão, o iniciador do monaquismo. Muitos séculos depois, em Assis, um outro jovem, há pouco convertido, entrou em uma igreja com um amigo. No Evangelho do dia, Jesus dizia aos seus discípulos: “Não leveis nada pelo caminho: nem cajado, nem sacola, nem pão, nem dinheiro, nem duas túnicas” (Lc 9,3). O jovem se voltou ao seu amigo e disse: “Ouviste isso? É isso que o Senhor que façamos também nós”. E iniciou daí a ordem franciscana.

A liturgia da Palavra é a melhor fonte que temos para fazer cada vez, da Missa, uma celebração nova e atraente, evitando assim o grande perigo de uma repetição monótona que, especialmente os jovens, acham entediante. Para que isto se realize, devemos investir mais tempo e oração na preparação da homilia. Os fiéis deveriam poder entender que a palavra de Deus toca as situações reais da vida e é a única a ter respostas às questões mais sérias da existência.

Há dois modos de preparar uma homilia. Alguém pode se sentar à escrivaninha e escolher o tema em base às próprias experiências e conhecimentos; assim, uma vez preparado o texto, pôr-se de joelhos e pedir a Deus para que infunda o Espírito nas próprias palavras. É algo bom, mas não é um modo profético. Para sermos proféticos, é preciso seguir a via inversa: antes, pôr-se de joelhos e perguntar a Deus qual é a palavra que ele quer fazer ressoar para seu povo

Deus, de fato, tem uma sua palavra para cada ocasião e não deixa de revelá-la ao seu ministro que a pedir humildemente e com insistência. No início, não se tratará mais do que um pequeno movimento do coração, uma luz que se acende na mente, uma palavra da Escritura que chama a atenção e que lança luz sobre uma situação vivida. Trata-se, aparentemente, de uma pequena semente, mas contém o que o povo precisa escutar naquele momento.

Depois disso, alguém pode se sentar à escrivaninha, abrir os próprios livros, consultar anotações, reunir e organizar os próprios pensamentos, consultar os Padres da Igreja, os mestres, às vezes, os poetas; mas agora, não é mais a palavra de Deus que está à serviço da sua cultura, mas a sua cultura a serviço da palavra de Deus. Só assim a Palavra manifesta o seu poder intrínseco.

A obra do Espírito Santo

Mas é preciso acrescentar uma cosa: toda a atenção dada à palavra de Deus, por si só, não basta. Sobre ela deve descer “a força do alto”. Na Eucaristia, a ação do Espírito Santo não é limitada apenas ao momento da consagração, à epiclese que se recita antes dela A sua presença é igualmente indispensável para a liturgia da palavra, e veremos, a seu tempo, para a comunhão.

O Espírito Santo continua, na Igreja, a ação do Ressuscitado que, após a Páscoa, “abria a inteligência dos discípulos para entenderem as Escrituras” (cf. Lc 24,45). A escritura, afirma a Dei Verbum, do Concílio Vaticano II, “deve ser lida e interpretada com o mesmo espírito com que foi escrita”[5]. Na liturgia da palavra, a ação do Espírito Santo é exercida mediante a unção espiritual presente em quem fala e em quem escuta.

“O Espírito do Senhor está sobre mim,
porque ele me consagrou com a unção
para anunciar a Boa-nova aos pobres” (Lc 4,18).

Jesus indicou assim de onde tira força a palavra anunciada. Seria um erro confiar-se apenas na unção sacramental que recebemos uma vez por todas na ordenação sacerdotal ou episcopal. Ela nos habilita a cumprir certas ações sagradas, como governar, pregar e ministrar os sacramentos. Ela nos dá, por assim dizer, a autorização para fazer certas coisas, não necessariamente algo da autoridade que as multidões percebiam quando Jesus falava; assegura a sucessão apostólica, não necessariamente o sucesso apostólico!

Mas se a unção é dada pela presença do Espírito e é seu dom, o que podemos fazer para tê-la? Primeiramente, devemos partir de uma certeza: “Nós recebemos a unção do Santo”, assegura-nos São João (1Jo 2,20). Ou seja, graças ao batismo e à crisma – e, para alguns, à ordenação presbiteral ou episcopal –, nós já possuímos a unção. Na verdade, segundo a doutrina católica, ela imprimiu em nossa alma um caráter indelével, como uma marca ou um selo: “É Deus – escreve o Apóstolo – que nos confirma juntamente convosco, em Cristo, como também é Deus que nos ungiu, nos marcou com seu selo e deu-nos, em nossos corações, a garantia Espírito” (2Cor 1,21-22).

Esta unção, porém, é como um unguento perfumado fechado em um vaso: permanece inerte e não libera nenhum perfume se não se quebrar e não se abrir o vaso. Assim acontece com o caso de alabastro quebrado pela mulher do evangelho, cujo perfume encheu a casa inteira (Mc 14,3). Aí está onde se insere a nossa parte em relação à unção. Ela não depende de nós, mas depende de nós remover os obstáculos que impedem sua irradiação. Não é difícil entender o que significa para nós quebrar o vaso de alabastro. O vaso é a nossa humanidade, o nosso eu, às vezes, o nosso árido intelectualismo. Quebrá-lo, significa pôr-se em estado de submissão a Deus e de resistência ao mundo.

Felizmente, nem tudo é confiado ao esforço ascético. Muito mais, nesse caso, a fé, a oração, a humilde súplica. Pedir, assim, a unção antes de nos dirigirmos a uma pregação ou a uma ação importante a serviço do Reino. Enquanto nos preparamos à leitura do evangelho e à homilia, a liturgia nos faz pedir ao Senhor para purificar o nosso coração e os nossos lábios para poder anunciar dignamente o evangelho. Por que não dizer, vez ou outra (ou ao menos pensar para si mesmo): “Ó Deus todo-poderoso, ungi-me o coração e os lábios, para que eu anuncie com a doçura e a força do Espírito a vossa palavra”?

A unção não é necessária apenas aos pregadores para proclamar eficazmente a palavra, também o é aos ouvintes para acolhê-la. O evangelista João escrevia à sua comunidade: “Vós já recebestes a unção do Santo e todos tendes conhecimento… a unção que recebestes da parte de Jesus permanece convosco e não tendes necessidade de que alguém vos ensine” (1Jo 2,20.27). Não significa que todo ensinamento seja inútil. Por que, então, João escreve a sua carta e nós lhes pregamos?, comenta Agostinho, e responde: “É o mestre interior quem realmente instrui, é Cristo e a sua inspiração a instruir. Quando falta a sua inspiração e a sua unção, as palavras externas fazem apenas um inútil ruído”[6].

Esperamos que também hoje Cristo nos tenha instruído com sua inspiração interior e o meu falar não tenha sido “um inútil ruído”.

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A Eucaristia, um Pentecostes contínuo

A Eucaristia é um lugar usual para a efusão do Espírito Santo. É o que Jean-Luc Moens procurou explicar durante a sua intervenção no Congresso Eucarístico Mundial, que aconteceu de 5 a 12 de setembro de 2021 em Budapeste. Veja o vídeo e o texto de seu ensinamento.

O Congresso Eucarístico Mundial

O 52º Congresso Eucarístico Internacional aconteceu de 5 a 12 de setembro de 2021 em Budapeste, Hungria. 
Esta semana de celebração, com as suas conferências, missas, adorações eucarísticas e procissões, bem como diversas atividades espirituais e culturais, visa aprofundar o conhecimento e a veneração da Eucaristia, tesouro precioso da fé cristã. 
Este congresso é “um ato de reflexão e de devoção. 
Trata-se de falar da Eucaristia, de compreender o que está em jogo da Eucaristia na sociedade contemporânea e, ao mesmo tempo, de manifestar, pela celebração eucarística e pela procissão, a devoção à hóstia. Consagrada ”, explica Christian Sorrel, membro do Pontifício Comitê para as Ciências Históricas.
Canal de vídeo do Congresso Eucarístico Internacional

A Eucaristia é um Pentecostes contínuo onde o Espírito Santo enviado pelo Pai realiza o milagre da transubstanciação, a transformação do pão e do vinho no Corpo e no Sangue de Jesus Cristo. Quando nos comunicamos , diz São João Paulo II, “Cristo também nos comunica o seu Espírito” ( Ecclesia de Eucharistia, § 17). Quando comemos o Corpo de Cristo, confirma Santo Efrém, comemos o Espírito Santo com ele. Cada Eucaristia é, portanto, uma efusão do Espírito Santo. É importante descobri-lo para poder vivê-lo plenamente e, na fé, deixar-nos transformar pelo Espírito. Se, como dizia São Serafim de Sarov, “a verdadeira meta da vida cristã consiste em adquirir o Espírito Santo de Deus”, então a Eucaristia é um lugar privilegiado para cumprir a nossa vocação.

1. Não há sacramentos sem o Espírito Santo

Para começar esta encruzilhada na Eucaristia e no Espírito Santo, parece-me importante sublinhar que o Espírito Santo está agindo em todos os sacramentos. Estes são os meios usuais imaginados por Deus desde toda a eternidade para nos encher com seu Espírito – o Espírito que nos purifica e deifica. O sinal que a liturgia nos dá desta ação do Espírito Santo nos sacramentos é o que se chama epiclese (do grego klesis -appel et épi-on: invocar o Espírito Santo em …). Cada sacramento tem uma ou mais epicleses, muitas vezes acompanhadas da imposição das mãos, que lembra o gesto que Jesus fez quando rezou pelos enfermos. Esta imposição de mãos é claramente visível durante uma confirmação ou ordenação – diaconal, presbiteral ou episcopal. Também existe, mais discretamente, no batismo, na confissão, no casamento ou no sacramento dos enfermos. Por exemplo, antes de dar a absolvição a uma pessoa que confessa, o sacerdote estende a mão sobre a cabeça para mostrar claramente que a purificação de seu coração acontecerá por uma nova descida do Espírito. Da mesma forma, depois de testemunhar seu compromisso final,

No caso da Eucaristia, existem várias epicleses.

2. Eucaristia e Espírito Santo

A primeira epiclese da Eucaristia

Para ilustrar a primeira epiclese da Eucaristia, gostaria de mostrar a vocês um pequeno vídeo feito em Lourdes no dia 7 de novembro de 1999. Foi durante uma missa presidida pelo Bispo Billé, então presidente da Conferência Episcopal Francesa. Os concelebrantes foram o cardeal Lustiger e o bispo Eyt, assim como todos os bispos franceses.

Você verá isso no momento da primeira epiclese, ou seja, quando o Bispo Billé disse “santifica estas ofertas derramando o teu Espírito sobre elas”. Que se tornem para nós o Corpo e o Sangue de Jesus Cristo nosso Senhor ”(Oração Eucarística II): a hóstia se levanta e começa a levitar. Podemos vê-lo subindo alguns centímetros acima da patena. Ela fica assim por longos minutos. As imagens não são falsas, os cinegrafistas afirmam ter filmado o fenômeno!

Projeção de vídeo:

O que acabamos de ver neste pequeno vídeo não está listado como um milagre eucarístico, porque a Igreja não se pronunciou oficialmente sobre este fenômeno. Mas ainda podemos interpretar o que vimos como um sinal. É o sinal da presença do Espírito no momento da primeira epiclese da Missa, quando o celebrante diz, impondo as mãos sobre o pão e o vinho: “Santifica estas ofertas, derramando o teu Espírito sobre elas”. É o Espírito Santo enviado pelo Pai que realiza o milagre da transformação do pão e do vinho no Corpo e Sangue de Jesus. É interessante notar que, para os orientais, a transubstanciação ocorre precisamente durante esta epiclese, enquanto para a liturgia latina é antes no momento em que o sacerdote pronuncia as palavras de Cristo: “Este é o meu corpo” e “Este é meu sangue ” .

A segunda epiclese da Eucaristia: uma oferta de glória

Há também, em cada Eucaristia, uma segunda epiclese menos visível porque não é acompanhada por um gesto do sacerdote como é a primeira em que ele coloca as mãos sobre o pão e o vinho. Aqui está, por exemplo, a dupla epiclese da Oração Eucarística III:

Quando formos nutridos com seu corpo e seu sangue e cheios do Espírito Santo, conceda-nos ser um corpo e um espírito em Cristo. Que o Espírito Santo nos faça uma oferta eterna para sua glória.

A obra do Espírito Santo é criar comunhão, a unidade do Corpo Místico da Igreja, para nos tornar um só corpo. Ele também nos dá a possibilidade de nos oferecermos ao Pai como sacrifício de ação de graças de Jesus, com ele e nele, como proclamado pela Doxologia final, para nos tornarmos uma oferenda eterna de glória, que se realizará plenamente no céu. Em cada Eucaristia, o Espírito Santo, portanto, dá-nos um antegozo do céu, unindo-nos e permitindo-nos ser oferendas para a glória do Pai.

Não sei se estamos suficientemente cientes desta obra de unidade e comunhão que o Espírito Santo realiza em cada Eucaristia. Em nossa sociedade individualista, talvez tenhamos a tendência de viver a Eucaristia de uma maneira muito exclusivamente individual: “meu” Jesus e eu. O relacionamento pessoal que podemos ter com Jesus é obviamente desejável e bom. Porém, às vezes estamos tão focados no fato de que Jesus se vai doar a nós em seu Corpo e em seu Sangue, que podemos esquecer que ele se doa também a outros que participam conosco da Eucaristia.

Sugiro que você tenha uma pequena experiência simples na próxima Eucaristia da qual participará. Em um determinado momento, por exemplo, no beijo ou no sinal da paz, olhe para as pessoas ao seu redor enquanto faz esta oração:

“Senhor Espírito Santo, tu estás a fazer de todos nós, todas as pessoas que participam nesta Eucaristia, um só corpo para a tua glória! Você nos reúne aqui para experimentar um antegozo do céu em comunhão. Lá nos encontraremos novamente e este momento de comunhão que vivemos hoje nesta Eucaristia será levado à sua perfeição para a eternidade. Glória a você pelo seu trabalho em todos nós! “

Presença ativa do Espírito Santo

A Eucaristia é, portanto, um dos lugares por excelência onde o Espírito Santo está presente e ativo. Vários místicos experimentaram fortemente a presença do fogo do Espírito no sacramento da Eucaristia. Assim, por exemplo, durante a Eucaristia, Catarina de Sena, doutora da Igreja, viu o altar rodeado de chamas como as da sarça ardente e, no meio do fogo, o Espírito Santo em forma de pomba. Quando ela recebeu a comunhão, o anfitrião pareceu-lhe ser um carvão em brasa que entrou nela como uma faísca de fogo. Esta visão de Catarina confirma as afirmações de dois outros doutores da Igreja, São João Crisóstomo e São João Damasceno.

“Não é o sacerdote que faz alguma coisa, mas é a graça do Espírito que brota nele, o cobre com as suas asas e realiza o sacrifício místico.”

“Você pergunta como o pão se torna Corpo de Cristo, e o vinho […] Sangue de Cristo? Digo-vos: o Espírito Santo irrompe e realiza aquilo que ultrapassa todas as palavras e todos os pensamentos […]. Basta-vos ouvir que foi pelo Espírito Santo, assim como foi da Santíssima Virgem e do Espírito Santo que o Senhor, por si e em si, assumiu a carne [3] . “

A analogia que João Damasceno faz é interessante: assim como o Espírito Santo engendrou o corpo do Unigênito no seio de Maria, ele transforma o pão no Corpo de Cristo e o vinho no seu Sangue. Eles são dois mistérios comparáveis. A diferença é que a primeira só aconteceu uma vez, a segunda acontece todos os dias em todos os altares do mundo.

A Eucaristia é, portanto, um dos lugares onde o Espírito Santo atua com força e, portanto, também um lugar privilegiado para receber cada vez mais o seu fogo, para renovar na fé o dom que recebemos no baptismo e na confirmação. Podemos dizer que a Eucaristia é um Pentecostes permanente, um lugar onde não só acolhemos Jesus que se doa a nós, mas também o seu Espírito Santo que o acompanha. São João Paulo II insiste neste ponto na encíclica Ecclesia de Eucharistia  :

“Pela comunhão com o seu corpo e com o seu sangue, Cristo também nos comunica o seu Espírito . Santo Efrém escreve: “Ele chamou o pão de seu corpo vivo, ele o encheu de si mesmo e de seu Espírito . […] E quem come com fé, come do Fogo e do Espírito […]. Pegue-o, todos comam e comam o Espírito Santo com ele. É realmente meu corpo e quem o comer viverá para sempre. “Na epiclese eucarística, a Igreja pede este dom divino, fonte de todos os outros dons. Lemos, por exemplo, na Divina Liturgia de São João Crisóstomo: “Nós te invocamos, te pedimos e te pedimos: envia teu Espírito Santo sobre todos nós e sobre estes dons, […] para que aqueles que take it share obtenha a purificação da alma, a remissão dos pecados e o dom do Espírito Santo. ”E no Missal Romano o celebrante pergunta:“ Quando formos nutridos com seu corpo e seu sangue e cheios do Espírito Santo, concede-nos ser um só corpo e um só espírito em Cristo. ”Assim, pelo dom do seu corpo e do seu sangue, Cristo faz aumentar em nós o dom do seu Espírito., já recebido no Baptismo e oferecido como “selo” no sacramento da Confirmação . “

Permitam-me sublinhar esta afirmação de São João Paulo II: quem come do corpo de Cristo também come do Espírito Santo. Jesus não vem nos visitar sozinho. Ele vem acompanhado do Espírito Santo. Cada comunhão é uma efusão do Espírito Santo. Cada Eucaristia é um Pentecostes! Ao receber o corpo de Cristo, também recebemos seu Espírito. Poucos cristãos, parece-me, estão cientes disso. Muitos de nós focamos no dom do Corpo e Sangue de Jesus. Eles não estão errados, é claro. Mas não devemos esquecer o Espírito Santo que é dado ao mesmo tempo. É dado, mas também devemos recebê-lo! Parece-me que na comunhão e na ação de graças que se segue, seria fecundo orar também ao Espírito Santo, para lhe dar lugar no coração, para nos deixar transformar por ele.

3. Nossa participação na obra da graça

Acabo de desenvolver a beleza da Eucaristia e a obra do Espírito Santo nela. Podemos nos perguntar: por que tantos batizados não são sensíveis a este dom, a esta graça extraordinária que é a Eucaristia? Sabemos que a porcentagem de cristãos praticantes entre os batizados é muito baixa. Antes, definíamos os praticantes como aqueles que iam à missa todos os domingos. Agora, chamamos de praticantes aqueles que vão à missa regularmente, por exemplo, uma vez por mês … Com a pandemia de Covid 19, também há uma erosão do último quadrado de praticantes. Na minha paróquia, que é uma paróquia dinâmica com muitas famílias jovens, os padres estão sofrendo. Um deles me confidenciou que, com o bloqueio, as pessoas se acostumaram a assistir à missa dominical pela internet;

Como explicar este desinteresse de tantos cristãos pelo maravilhoso dom que Jesus lhes deu da Eucaristia?

Para responder a essa pergunta, gostaria de destacar duas coisas:

  • Lembre-se da doutrina católica sobre os sacramentos;
  • A necessidade de se abrir mais ao Espírito Santo.

Lembrete sobre os sacramentos

Os sacramentos não são ritos mágicos que atuariam automaticamente sem a colaboração de quem os recebe. Para serem plenamente eficazes, os sacramentos requerem nossa colaboração, nossa abertura, nossa participação. É, portanto, uma sinergia entre a onipotência de Deus e nossa liberdade humana.

É por isso que a teologia sacramental distingue entre a ação de Deus e a resposta do homem. A ação de Deus é chamada opus operatum , a ação realizada, e o que depende da liberdade do homem é chamada opus operantis , a ação a ser realizada. O CEC explica no número 1128  :

Os sacramentos agem ex opere operato (literalmente: “pelo próprio fato de que a ação é realizada”), isto é, em virtude da obra salvífica de Cristo, realizada de uma vez por todas. Segue-se que “o sacramento não é realizado pela justiça de quem o dá ou recebe, mas pelo poder de Deus” (S. Thomas d’A., S. Th. 3, 68, 8). […] Porém, os frutos dos sacramentos também dependem das disposições de quem os recebe.

Por exemplo, se uma pessoa recebe o sacramento do casamento ou ordem enquanto está em pecado mortal, ela não pode receber nenhuma graça desses sacramentos. Mas se ela se converte, se ela confessa, então os sacramentos recebidos são reativados, podem ser implantados sem obstáculos e trazer as graças que contêm porque Deus é fiel e não retira seus dons. Este exemplo mostra claramente que a eficácia dos sacramentos depende de quem a recebe, embora Deus sempre atue plenamente no sacramento.

Também no batismo a participação ativa do destinatário do sacramento desempenha um papel. Para as crianças pequenas, é a fé dos pais, padrinhos e madrinhas que permite que o sacramento se realize plenamente. É assim que, no baptismo, a criança é salva do pecado original, recebe o dom das virtudes teológicas (fé, esperança e caridade) e torna-se filho de Deus. Isso é alcançado por meio da ação eficaz do Espírito Santo. Mas é claro que a criança terá que se apropriar dos dons recebidos, principalmente por meio de sua fé pessoal. É por isso que o batismo é considerado um sacramento “vinculado”, no sentido de que seu fruto pode não ser plenamente experimentado pelo batizado. Mas cabe a ele pedir a graça de liberar totalmente os dons recebidos para viver plenamente desde o seu batismo.

É o mesmo na Eucaristia. Durante a primeira epiclese, a transformação realizada pelo Espírito Santo do pão e do vinho no Corpo e Sangue de Jesus Cristo não depende da santidade do sacerdote nem da resposta dos fiéis que dela participam. É a obra de Deus. A hóstia consagrada e o vinho são de fato o Corpo e o Sangue de Cristo, independentemente da fé da assembléia. Por outro lado, o cumprimento da segunda epiclese depende do coração dos fiéis que participam da Eucaristia. Eles estão prontos para se oferecer para se tornarem um só corpo e uma oferta eterna para a glória do Pai?

A questão, portanto, diz respeito à recepção que os fiéis farão do dom que o Espírito Santo lhes concede na Eucaristia. É por isso que São Paulo nos avisa:

Portanto, quem comer o pão ou beber o cálice do Senhor indignamente terá que responder pelo corpo e pelo sangue do Senhor. Que cada um, portanto, teste a si mesmo, e assim coma deste pão e beba deste cálice; pois aquele que come e bebe, come e bebe sua própria condenação, a menos que discerne o Corpo. (1 Cor 11, 27-29)

As palavras de Paulo são muito fortes! Se participamos da Eucaristia indignamente, por exemplo em estado de pecado mortal ou sem ter fé na presença real (discernindo o Corpo … de Cristo), comemos e bebemos nossa própria condenação.

Não quero assustá-lo com estas palavras de Paulo, nem torná-lo escrupuloso a ponto de hesitar em receber o dom da Eucaristia. Jesus arde sempre com o desejo de doar-se a nós na sua Eucaristia e sabe que somos fracos e pecadores. Só quero salientar que nossa liberdade está envolvida em como O recebemos. E sempre há espaço para melhorias nessa área. Um dos meios à nossa disposição é nos abrirmos mais ao Espírito Santo. Como a Eucaristia é obra do Espírito Santo, também é ele quem pode ajudar-nos a participar dela cada vez mais dignamente. Este é meu próximo ponto.

Abra-se para o Espírito Santo

Estou convencido de que, se muitos cristãos não perceberam a extraordinária beleza da Eucaristia, é porque também não descobriram o Espírito Santo como pessoa ativa em suas vidas. Posso testemunhar que, pela minha parte, foi esta descoberta que me tornou um amante da Eucaristia que quero viver todos os dias e não apenas aos domingos.

Nasci em uma família cristã, pelo menos minha mãe era uma praticante convicta. Ela me ensinou a orar. Ela me levava à missa todos os domingos. Eu fui para uma escola católica cujo diretor, um santo sacerdote, era um amante do Espírito Santo. Foi ele quem me preparou para o sacramento da confirmação.

Portanto, sempre fui um cristão praticante, mas durante minha adolescência tive muitas perguntas sobre a existência de Deus e sobre Jesus. Isso não me impediu de continuar a ir à missa todos os domingos, o que – creio eu – foi uma grande graça.

Quando conheci aquela que se tornaria minha esposa, ela me levou para sua paróquia e foi lá que descobri a Renovação Carismática, que estava no seu início. Depois de muita resistência, decidi pedir a oração pelo batismo no Espírito que também é chamado de derramamento do Espírito. É uma experiência que consiste em viver plenamente as graças do próprio baptismo. Em muitos casos, não vivemos plenamente as graças recebidas em nosso batismo. É como se tivéssemos uma magnífica adega, mas nunca descêssemos para beber as garrafas. O Baptismo no Espírito consiste em descer à sua adega e começar a beber as garrafas, ou seja, viver plenamente os dons que recebemos no nosso baptismo e deixar-nos guiar de uma nova forma pelo Espírito Santo.

Depois de receber esse derramamento do Espírito, minha vida começou a mudar aos poucos. Em primeiro lugar, Jesus se tornou uma pessoa viva em minha vida. Eu queria ouvi-lo, falar com ele, orar para ele. De repente, a Bíblia – a Palavra de Deus – tornou-se central em minha vida. Com tudo isso, os sacramentos se tornaram verdadeiramente fontes vitais para mim. Como é o Espírito Santo quem atua nos sacramentos, e especialmente como vimos na Eucaristia, não é de estranhar que, ao me abrirem mais a este Espírito, os sacramentos tenham mudado. Cor: tornaram-se para mim verdadeiros locais de encontro com o Cristo Ressuscitado. Esta é a obra do Espírito Santo.

Digo-vos este testemunho porque estou convencido de que a chave para a verdadeira devoção eucarística é a abertura ao Espírito Santo. É o Espírito Santo que atua na Eucaristia, é ele – como vimos – quem transforma o pão e o vinho no Corpo e no Sangue de Jesus Cristo. É lógico pensar que também é ele quem pode nos ajudar a descobrir todas as riquezas ocultas.

Não pense que estou absolutizando a experiência pessoal. Somos 120 milhões de católicos que fizeram esta experiência de batismo no Espírito. Nosso Papa Francisco também descobriu esta graça. Ele repetidamente pediu àqueles que tiveram essa experiência que a compartilhassem com a Igreja. Aqui está um exemplo desse pedido que ele fez na véspera de Pentecostes de 2019 ao lançar CHARIS, o novo serviço que ele queria para a Renovação Carismática Católica:

Você me pediu para dizer o que o Papa e a Igreja esperam deste novo serviço, de CHARIS e de toda a Renovação Carismática. […] O que o Papa espera de você: que este movimento compartilhe o batismo no Espírito com todos na Igreja . É a graça que você recebeu. Compartilhe! Não guarde isso para você! (8 de junho de 2019)

Mais recentemente, o Cardeal Raniero Cantalamessa, pregador da Casa Pontifícia e assistente eclesiástico de CHARIS, comentou este pedido do Papa perante toda a Cúria Romana. Ele disse [8]  :

Uma das formas pelas quais o Espírito se manifesta hoje fora dos canais institucionais da graça é chamada de “Batismo no Espírito”. Menciono isso aqui sem qualquer intenção de proselitismo, mas em resposta à exortação que o Papa Francisco freqüentemente dirige a todos aqueles da Renovação Carismática Católica para compartilhar com todo o povo de Deus esta “corrente de graça” em que vivemos. O Batismo do Espírito.

A expressão “Batismo no Espírito” vem do próprio Jesus. Referindo-se ao próximo Pentecostes, antes de subir ao céu, ele disse aos seus apóstolos: “Enquanto João batizava com água, vós, é no Espírito Santo que em breve sereis batizados. De dias” (Atos 1: 5). É um rito que não é esotérico, mas consiste em gestos de grande simplicidade, calma e alegria, acompanhados de atitudes de humildade, arrependimento, disponibilidade para se tornarem filhos.

É uma renovação e uma atualização não só do batismo e da confirmação, mas de toda a vida cristã: para os esposos, do sacramento do matrimônio; para os sacerdotes, de sua ordenação sacerdotal; para as pessoas consagradas, da sua profissão religiosa. O interessado prepara-se para isso, além de uma boa confissão, participando nas reuniões catequéticas, durante as quais é recolocado em contato vivo e alegre com as principais verdades e realidades da fé: o amor de Deus, o pecado, a salvação, vida nova, transformação em Cristo, carismas, frutos do Espírito. O fruto mais frequente e importante é a descoberta do que significa ter “uma relação pessoal” com Jesus ressuscitado e vivo.

Veja, esta experiência é simples e aberta a todos

  • Qualquer que seja o nosso estado de vida, casado, celibatário, religioso ou sacerdote,
  • Qualquer que seja a situação de nossa vida espiritual, inicial ou mais avançada,
  • Seja qual for a nossa idade, jovem ou velho …

Por que o Papa Francisco deseja que o maior número possível de pessoas batizadas receba o batismo no Espírito? É porque compreendeu que esta experiência leva quem a fez a viver a sua vida cristã de uma forma mais empenhada, plena, mais disponível à acção do Espírito Santo na sua vida quotidiana. É simplesmente uma questão de viver plenamente as graças recebidas no nosso batismo: de pedir ao Espírito Santo que desamarre o que ainda está vinculado neste sacramento. E esse é o sonho do Papa para cada um de nós: que sejamos cristãos plenamente realizados!

O Cardeal Cantalamessa ousou convidar toda a Cúria Romana a fazer esta experiência, a receber esta efusão do Espírito:

O “batismo no Espírito” provou ser uma maneira simples e poderosa de renovar a vida de milhões de crentes em quase todas as igrejas cristãs. Já não podemos contar o número de pessoas que eram cristãs apenas no nome e que, graças a esta experiência, se tornaram cristãs de facto, dedicadas à oração de louvor e aos sacramentos, ativas na evangelização e prontas a assumir tarefas pastorais no freguesia. Uma verdadeira conversão da mornidão ao fervor! Você teria que dizer a si mesmo o que Agostinho repetia para si mesmo, quase indignado, ouvindo as histórias de homens e mulheres que, em seu tempo, abandonaram o mundo para se dedicarem a Deus: “  Si isti et istae, cur non ego? … ” Se sim, por que não eu também?

Por que não eu ?

Por que eu não pediria ao Espírito Santo para ocupar mais lugar em minha vida, para me iluminar, para me guiar, para me ajudar?

São Serafim de Sarov, um santo ortodoxo, disse: “O verdadeiro objetivo da vida cristã é a aquisição do Espírito Santo de Deus. É um trabalho para toda a vida. O dom de Deus nunca se esgota. Deus sempre quer se dar mais. Qualquer que seja o estágio que tenhamos alcançado em nossa vida espiritual, o Espírito Santo ainda não terminou sua obra; ele quer se entregar a nós sem limites. E nós, estamos prontos para recebê-lo, para deixá-lo fazer isso, para sermos queimados, consumidos pelo seu amor?

4. A Eucaristia, um Pentecostes contínuo

Se quisermos crescer no conhecimento do Espírito Santo, se quisermos recebê-lo cada vez mais, podemos pedir para experimentar o batismo no Espírito de que fala o Cardeal Raniero Cantalamessa, aproximando-se de um grupo de oração da Renovação Carismática. Mas também há um lugar especialmente indicado para viver este novo Pentecostes pessoal: a Eucaristia!

Como disse no início desta intervenção, a Eucaristia é um Pentecostes contínuo, um lugar privilegiado para a ação do Espírito Santo. Então, por que não decidir agora viver conscientemente todas as nossas Eucaristias como efusão do Espírito Santo? Em cada Eucaristia, estão reunidas todas as condições para fazer esta experiência:

  • Conversão pessoal com a confissão dos pecados no início da Missa: humildemente pedimos perdão ao Senhor por todas as nossas faltas, nossas recusas de amor;
  • Ouvir a Palavra onde podemos nos deixar ser ensinados pelo Senhor;
  • A nossa oferta: no ofertório, podemos exercer o nosso sacerdócio baptismal, oferecendo  «as nossas pessoas como hóstias vivas, santas e agradáveis ​​a Deus» (Rm 12,1);
  • No momento da epiclese, pede ao Espírito Santo que desça também sobre nós ao mesmo tempo que “santifica as ofertas” (Oração Eucarística II). Que ele nos santifique, nos transforme, nos permita arder de amor, porque ele é Amor.
  • Na hora da comunhão, para receber o Corpo de Cristo no qual o Espírito resplandece, ou, como dizia Santo Efrém, para comer o Espírito Santo. Aqui, o agradecimento silencioso é muito importante; permite-nos dar tempo à graça para que se desenvolva em nós e dê todos os frutos que podemos esperar da nossa participação na Eucaristia.

Sugiro que agora você viva cada Eucaristia desta forma, em total disponibilidade ao Espírito Santo. Que cada Eucaristia se torne para você um novo Pentecostes pessoal. Posso dizer-lhe que isso vai agradar a Jesus, que ansiava por nos dar o seu Espírito Santo. Mas também transformará o seu modo de viver a comunhão eucarística: o Espírito Santo vai ensiná-lo a receber Jesus, verdadeiro Deus e verdadeiro homem que vem visitar-vos.

As coisas não vão acabar aí. Se você viver cada Eucaristia como um novo Pentecostes, toda a sua vida mudará. Você verá a ação do Espírito Santo se desdobrar com força em sua vida para alcançar a meta que o Senhor nos propõe: a santidade.

“Seguindo o exemplo do Santo que te chamou, também tu te tornas santo em toda a tua conduta, como está escrito: ‘Sereis santo, porque eu sou santo.’ » (1 P 1, 15-16).

O Espírito Santo é santo e é ele quem faz os santos! Deixemo-nos ser feitos por ele para levar alegria ao pai.

Porfsweb

O Sagrado Coração de Jesus e a Comunidade Emanuel

Tema do Encontro Comunitário de 19 de Junho de 2021, pela Ana Farinha (consagrada no Celibato pelo Reino na Comunidade Emanuel e a viver em Paray-le-Monial, a cidade francesa onde Jesus visitou Santa Margarida Maria) Apresentação PowerPoint